"Se o povo não ginga, é ditadura / ... / Música é milagre, faz cura", rima Rincon Sapiência na batida veloz de Onda, sabor e cor, quinta das 13 músicas do segundo álbum do rapper paulistano. Mundo Manicongo – Dramas, danças e afroreps aporta no universo pop digital nesta segunda-feira, 25 de novembro, com convite à dança engajada.
Na capa do disco, criada com colagens do artista Flagelado e com inspiração na estética dos quadrinhos, Rincon se agiganta sobre a zona periférica da cidade de São Paulo (SP) em que Danilo Albert Ambrósio, vulgo Manicongo, veio ao mundo há 34 anos.
Na imagem que sugere voo livre sobre o gueto, o rapper aparece do tamanho que já mostrou ter no primeiro álbum, Galanga livre (2017), título já referencial do hip hop nacional.
Em Mundo Manicongo, Rincon Sapiência celebra a dança e o direito à dança, motes do disco, como já sinalizara o prévio single Meu ritmo, lançado em 25 de outubro com inédita música autoral turbinada com sample de gravação do já octogenário músico africano Famoudou Konatè, baterista e percussionista guineense, referência mundial da cultura malinkè. Tudo a ver com quem faz afro rap.
Manicongo cai no suingue, consciente de que é preciso dançar para não dançar. Só que, reafirmando a altivez e orgulho da negritude celebrada no álbum antecessor Galanga livre, o rapper dita o ritmo da dança de Mundo Manicongo, conectando a ancestral mãe África ao Brasil de 2019, seja nos contagiantes beats eletrônicos da música-título Mundo Manicongo, seja no toque do berimbau que marca Real oficial, rap em que o artista rebobina o necessário discurso do gueto que cobra justiça social.
Uma das bases da sólida formação musical do artista, o som black norte-americano reverbera reprocessado no dueto com Rael no rap Me nota, no canto de Sensação com Lellê e na entrada de Rincon no baile com a mina Duquesa, com quem divide Amor e calor. Lellê bisa a participação no disco em Eu mereço, exaltação funkeira do batidão erotizado do baile.
Pega a visão: o mundo de Manicongo desconhece a fronteira imposta pelas elites aos guetos. O que legitima a conexão do rap paulistano com o eletrônico pagode baiano do Àttooxxá, convidado de Arrastão. Até Mano Brown cai no suingue com Manicongo em Não sei pra onde na batida contemporânea desse álbum editado pelo selo do anfitrião, MGoma.
Mundo Manicongo encerra com Primeiro volante, verso livre em que o artista reaviva a cultura dos sagazes MCs das batalhas urbanas do rap. "A vida de muitos é a balada / Precisa ferver pra não ter gelada", rima Sapiência, dando a visão do gueto. Sim, o Mundo Manicongo é regido por lei que garante o direito dos manos à justiça, ao prazer, à diversão e à arte.
Fonte: G1 Mauro Ferreira